A Filosofia dos Vilões

Após o sucesso de nossas reflexões sobre os maiores super-heróis da ficção, nada melhor do que fazer o mesmo com suas contrapartes. Os vilões, obviamente não são bons exemplos, mas, trazem em seus erros, lições que podemos aprender, para compreender as armadilhas da vida e da mente. Sem mais delongas, bora analisar as mentes criminosas da cultura pop.

STAR WARSTERRORHARRY POTTERMARVEL E DC

Rafael Silva

9/28/20259 min read

Os Sentimentos de Darth Vader

Darth Vader é o maior vilão do cinema. Seu traço mais marcante talvez seja justamente a sua falta de expressão, sisudo e sempre escondendo suas emoções por detrás de sua máscara e sua voz mecânica. Porém, não existe personagem em Star Wars que seja mais escravo de seus sentimentos e desejos do que Darth Vader.

Desde cedo, Anakin teve que enterrar seus sentimentos por sua mãe e por Padmé, para seguir os dogmas da Ordem Jedi. Ele também teve que esconder sua sede de grandeza, apesar de ser o Escolhido, era tratado por Obi-Wan e pelo Conselho como um Jedi comum.

O medo e o ódio sempre o acompanharam, mas ele sempre foi instruído a ignorá-los, e não a dominá-los ou entendê-los. Os jedis subestimaram o potencial do Escolhido para o caos.

Quando Palpatine ofereceu a ele a oportunidade de romper essas correntes e conhecer seu verdadeiro potencial e viver ao lado das pessoas que amava, ele não pôde resistir. Porém, tudo deu errado. Consumido em seu próprio ódio, Vader tornou-se tudo que havia jurado destruir e virou prisioneiro de si mesmo.

Após ser destruído fisicamente por Obi Wan, Vader ficou preso em seu próprio traje, em um estado sub-humano, e refém de seu medo e seu ódio. Aqui, os sentimentos negativos de Vader não eram mais escondidos, e sim usados. Ele se arrependia todos os dias pelo que havia feito, e o ódio era a única forma de se manter sempre irracional, distante da culpa que tentava consumi-lo.

Mas, apesar de inspirar o medo nos corações de toda a galáxia, o Lorde Sith também era atormentado por ele, especialmente em seu sono, com as constantes lembranças de seu erro.

Porém, também foram os sentimentos que levaram o vilão à sua redenção. O amor por seu filho e seu arrependimento pelos seus erros levaram Anakin a destruir Vader em seu coração e sacrificar-se em amor por Luke. Assim, poucos instantes antes da morte, ele enfim encontrou seu equilíbrio, enfim, nos braços de seu filho, ele pôde ser Anakin Skywalker.

Vader nos ensina que ocultar nossos sentimentos é um erro grave. Sejam eles bons ou ruins, é sempre importante contá-los a alguém que nos ajude a compreendê-los, e não permitir que eles tomem conta de nós por completo.

No fundo, por mais desalmado que Vader parecesse ser, ele é um verdadeiro mar de sentimentos, em constante conflito. Não é por menos que ele é considerado um dos personagens mais icônicos da ficção.

O Narcisismo de Lex Luthor

Lex Luthor é um dos maiores vilões dos quadrinhos e talvez o mais realista. Um magnata bilionário, mestre do crime, brilhante a ponto de parecer sobre-humano... e completamente obcecado por sua própria imagem.

Ele tinha gosto pelo poder, pela atenção, pelos holofotes. Luthor não fazia o que fazia por dinheiro, e sim para satisfazer seu ego insaciável. Porém, quando Superman surgiu, tudo mudou.

O Homem de Aço roubou as manchetes, todos ficavam fascinados com seus feitos de poder, e acima de tudo, de bondade. Além disso, ele vinha desmantelando o Império Criminoso de Lex, deixando-o furioso.

Desde então, ele devotou sua vida a destruir o Escoteiro Azul, criando armadilhas e aberrações muito além do seu controle, sem se importar com as consequências, ele precisava se sentir melhor que o Superman, não importava o quanto isso custasse.

No fundo, é fácil perceber o que realmente irrita Lex. Ele se alimenta de atenção, faz de tudo para obtê-la, enquanto Superman, pouco se importa com holofotes ou elogios, e ainda sim, os recebe. Superman faz o que faz por amor a humanidade, enquanto Luthor, faz pelo ´´amor´´ dela.

Luthor acha que o Kriptoniano não merece seu status, por não ser humano. Mas no fundo, em sua simplicidade e humildade, Clark é muito mais humano que Lex. Ele ama, comete erros, sente medo, como qualquer um, mas é humilde o suficiente para admiti-los e corrigi-los, e nunca se desvia de sua nobre missão. Enquanto Lex, em seu egocentrismo doentio, se torna um animal, fissurado somente em si mesmo, capaz de maldades tão absurdas, que lhe tornam algo quase sub-humano.

Lex Luthor vai muito além de planos mirabolantes e megalomaníacos, ele é o retrato do que o narcisismo e a inveja podem fazer com um homem, que mesmo tendo tudo, nunca se vê satisfeito, ele tem a necessidade de puxar para baixo todos que ascendem ao seu lado.

Ele inveja o Homem de Aço, porque vê naquele alien, um homem melhor do que ele jamais será.

O Caos do Coringa

Poucos vilões dividem tanto a opinião pública quanto o Coringa. Em algumas versões, ele é uma vítima da sociedade. Em outras, é um monstro frio e manipulador. Mas será que sofrimento justifica o caos?

As motivações do Coringa variam de versão para versão. Na HQ ´´ A Piada Mortal´´, o Palhaço do Crime era um comediante fracassado, que após uma sequência de traumas e um grave acidente com químicos, perdeu totalmente o controle sobre sua mente e se tornou um agente do caos. Algo semelhante foi apresentado na versão de Joaquin Phoenix, onde, após ser humilhado e violentado de inúmeras formas, ele decidiu se tornar a representação de tudo que há de errado na sociedade.

Mas será que essa dor justifica as centenas de crimes terríveis cometidos pelo vilão, que destruíram as vidas de milhares de pessoas? Obviamente não! Até porque ele não faz o que faz simplesmente como uma ferramenta para provar um ponto de vista, e sim por puro e simples sadismo na maioria das vezes.

Ele é um grande exemplo de psicopata. De acordo com a psicóloga Ana Beatriz, o Coringa de Heath Ledger seria um psicopata clássico, sem apreço nenhum pela vida dos outros, e sendo um verdadeiro mestre da manipulação. Outro fator que confirma isso é a tolerância do vilão à dor, mesmo apanhando brutalmente de Batman, o vilão apenas ri, outro traço de um psicopata, que sente prazer na dor, estando sempre no controle da situação. Tudo isso se aplica também à versão do personagem nas HQS.

Já o Coringa de Joaquin Phoenix teria um tipo de psicose, criando uma realidade completamente diferente e paranoica em sua mente, o que explica as diversas alucinações do personagem na história, principalmente no final.

O Coringa sofreu em sua vida, encheu seu coração de ódio e medo, e, cansado de ser vítima dele, decidiu render-se à loucura, para não sentir mais essa dor, se acovardou perante as dificuldades. Em sua insanidade, ele decidiu que não iria sofrer sozinho e espalhou esse sofrimento sobre diversas pessoas inocentes, tornando-se o mal que o transformou em quem é. Diversos heróis como Homem-Aranha, Wolverine e o próprio Batman também tiveram seus mundos destruídos, tinham tudo para se render à insanidade e destruir tudo à sua volta para descontar sua frustração, mas escolheram fazer diferente.

O Coringa e sua loucura são a síntese dos problemas da sociedade moderna e como ela pode afetar uma mente fragilizada. Mas, ao mesmo tempo, demonstra que se vitimizar e se deixar levar por essa maldade nos torna monstros que a mantêm nesse ciclo sem fim de decadência. O Coringa não é, e nunca será, um exemplo a ser seguido, e sim, evitado.

O Ódio do Magneto

Muitos fãs da Marvel afirmam 'Magneto estava certo', acreditando que os crimes do vilão se justificam, em nome de uma guerra contra a repressão imposta pelos humanos sob a comunidade mutante. Mas, será que isso realmente faz sentido?

Erik, desde cedo, sentiu na pele o ódio do homem por tudo que é diferente e difícil de compreender. Nos campos de concentração da Alemanha, ele viu seus pais serem mortos, em apenas uma das várias demonstrações da maldade humana. Ele via seus iguais serem reprimidos e mortos por seres fracos e ignorantes, que tratavam seus semelhantes como animais, e os mutantes, como monstros.

No processo, ele conheceu Charles Xavier, um mutante que, assim como ele, sofreu por seus dons, mas, diferentemente de Erik, queria ensinar os humanos a respeitá-los e promover uma convivência harmônica entre todos. A luta de Erik já não era apenas por justiça, mas por um senso de superioridade.

Ele julgava que os mutantes deveriam governar a Terra como a espécie dominante, tornando reais todas as mentiras espalhadas pela mídia quanto à comunidade mutante. Os Sentinelas, criados como reação a seus atos, se tornaram uma ameaça descontrolada, exterminando não apenas mutantes, mas também civis, ampliando o ciclo de ódio que ele ajudou a alimentar.

Essa divergência fez com que bons amigos se tornassem inimigos mortais. Charles fundou os X-Men, dedicados a proteger a humanidade, acolher jovens mutantes e promover a paz entre eles e os humanos. Por sua vez, Erik criou a Irmandade Mutante para dominar o planeta, mesmo que para isso precisasse derramar sangue de seus iguais.

Magneto não é somente um líder ideológico em busca de seu objetivo, ele é um megalomaníaco manipulador. Um homem que traiu e manipulou a comunidade que ele jurou proteger, para usá-la em prol de seus próprios desejos. Então, não, Magneto NÃO estava certo. Por mais que seu ódio seja parcialmente justificado pelas injustiças sofridas pela comunidade mutante, a morte de inocentes, tanto humanos quanto mutantes, em nome dessa causa, jamais será justificada. Magneto é um monstro para uns e um ícone para outros. Um empecilho para a paz por um lado, e um caminho para a libertação por outro.

A Escravidão de Drácula

Drácula não é apenas um vilão, é um mito. Um espelho sombrio da alma humana que se entregou ao prazer e perdeu tudo que a tornava viva.

Drácula é um dos vilões mais clássicos da ficção. Estando há décadas sob domínio público, o maior vilão do terror foi adaptado para diversas roupagens, algumas ótimas, outras ridículas. Essa diversidade o transformou em algo maior que um personagem de cinema: um verdadeiro mito popular.

Porém, essa falta de seriedade pode ter lhe desviado de sua proposta original.

O Vampiro vendeu sua humanidade por 'poder'. Poder para viver por séculos imerso em prazeres profanos, sejam sexuais, sejam materiais.

Porém, nesse processo, foi destituído de tudo que o tornava humano. Já não podia andar à luz do sol, nem experimentar qualquer sentimento positivo.

Em seu princípio, ele foi um homem comum, um nobre guerreiro, que ao perder sua esposa, perdeu também sua fé. Em revolta, decidiu voltar-se contra tudo que simboliza o bem, tornando-se o bastião do mal no mundo.

Sozinho por séculos, ele se cercou de noivas mortas-vivas, cheias de beleza, mas vazias de vida, sendo nada mais que meras escravas do Conde. Não importa o quanto ele tentasse, ele era incapaz de sentir amor. Do que adianta viver milênios, se não é capaz de amar? Se ele é obrigado a fingir que ainda é humano, quando na verdade, é um animal da noite, prisioneiro de sua própria maldade.

Drácula é o retrato do que acontece quando os desejos vencem os limites morais. Sem alma, sem amor e sem redenção, ele é a sombra do que um dia foi humano.

O Medo de Voldemort

Lorde Voldemort já nasceu condenando a maldade, sendo incapaz de amar ou ter empatia por qualquer um. Porém, sua sede de poder e grandeza, somada a seu medo irracional de perde-lo, lhe transformaram no maior monstro que o mundo bruxo já viu.

Voldemort é incapaz de sentir quaisquer tipos de sentimentos de empatia, por ter sido concebido através de uma poção do amor, que automaticamente bloqueia isso em sua mente. Isso, nada mais é que uma metáfora para a psicopatia, um distúrbio real, que priva a mente de quem o possui, de compreender sentimentos como esses.

Além de imune a sentimentos, Riddle é fascinado pela grandeza, desejando sempre ser o centro das atenções, seja amado, seja temido. Porém, ele é vítima da máxima dos tiranos. Todo o homem que almeja o poder e consegue obtê-lo, teme mais que tudo, vê-lo escorrer por entre seus dedos. Voldemort temia a morte.

O vilão apresenta um distúrbio conhecido como Tanatofobia, o medo surreal da morte (Nome dado em homenagem ao deus grego da morte, Tanatos). O bruxo foi capaz de praticar os piores tipos de bruxaria, como as horcruxes, e fazer tudo possível para evitar a morte. Os seus milhares de assassinatos, também refletem essa doença. Matar, faz com que Voldemort se sinta sob o controle da vida e da morte, se achando acima dela, mas no final, mesmo com tudo que fez para evitar isso, o seu maior medo se tornou realidade.

No fim, Voldemort morreu como todo o ser humano um dia irá. Sua busca incansável por poder, lhe levou de volta ao pó, algo inevitável, até mesmo para ele.